quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Crua



Tento despir a alma catando palavras. Sobrepondo estrelas encontro o fundo de verdade daquilo que sempre fui. Olhando nos olhos da escuridão é que me sinto iluminada, e é a sós que estou na mais pura companhia. Descobrindo as paredes de dentro desvendo o tamanho das rachaduras mas também o esforço da reconstrução. É isso que me incomoda - a impressão de que já fui mais de mim mesma antes de saber a exata altura das quedas, o improvável destino dos medos, a debilidade dos sentimentos recalcados, a inexatidão dos amores eternos, a estupidez das amizades inventadas. Em minha própria homenagem, se pudesse voltar, retornaria a ser a mesma menina pequena e frágil, choraria as mesmas lágrimas e amanheceria com olhos inchados, amaria os mesmos amores eternos, cultivaria as mesmas amizades de infância que durariam para sempre e não iriam mesmo passar do segundo ato, contemplaria os mesmos pôres-de-sol, amanheceria dona do mundo e anoiteceria a mulher mais feliz. Escreveria por horas a fio aquela história pra não ser lida, daria a cara os mesmos tapas, lutaria as mesmas lutas pra ganhar ou pra perder. Carregaria no peito o mesmo caminhão de sonhos e me vestiria de agoras, encantos e ternuras como se aquilo tudo fosse a minha mais sagrada missão. Eu me encantaria com os olhos dos outros e cantaria as canções mais melosas e fecharia os olhos pra me manter de pé. Eu seria de novo tudo que fui se tivesse que escolher entre chegar aqui ou pegar atalho. Essa é a minha estrada e esses fru-frus me fazem quem eu realmente sou, quer você queira quer não.

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