quinta-feira, 27 de maio de 2010

Musas - Cora Coralina




















Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas - pseudônimo: Cora Coralina
* 20/08/1889
+ 10/04/1985

Ela nasceu com a república, morreu antes que se promulgasse a Constituição Federal de 1988. Começou a escrever muito cedo, em 1903 (aos 14 aninhos) e publicava nos jornais de Goiás usando já o pseudônimo que a consagraria para a posteridade. Nos anos áureos da rebeldia e da paixão desmedida (1911), fugiu pra Jaboticabal, interior paulista. Imagine o que era fugir de casa aos 22 aninhos de idade, com um homem di-vor-ci-a-do queridos leitores e leitoras!!! Tragédia mundial pra família... Que atrevida apaixonada ela foi!!! Isso lhe rendeu muito sofrimento, porque o marido era um orangotango genuíno - muitos vivas assim mesmo (não por acaso, uma musa). 23 anos, 6 filhos e muitas brigas após (o marido até a proibiu terminantemente de participar da semana da arte moderna - foi convidada por ninguém menos que Monteiro Lobato), ela vai pra São Paulo Capital ser vendedora de livros numa editora (José Olímpio) que lançaria seu primeiro livro: "o poema dos becos de Goiás e estórias mais". Cora pra mim, representa o atrevimento doce daquela que espera pela realização de um sonho. Esperou como boa moça, o enterro do marido (que era de modos rudes e absolutamente contrário à liberação da musa) pra se descobrir como escritora, poetisa, mulher. São demais os encantos de seus escritos. Um parco conhecimento sobre sua vida torna ainda mais doce sua obra. Parecia estar sentindo sobre mim mãos muito suaves enquanto lia, e ficou difícil escolher apenas um poema, mas trato é trato. Deliciem-se.

ASSIM EU VEJO A VIDA

A vida tem duas faces:
Positiva e negativa
O passado foi duro
mas deixou o seu legado
Saber viver é a grande sabedoria
Que eu possa dignificar
Minha condição de mulher,
Aceitar suas limitações
E me fazer pedra de segurança
dos valores que vão desmoronando.
Nasci em tempos rudes
Aceitei contradições
lutas e pedras
como lições de vida
e delas me sirvo
Aprendi a viver.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Sem saída.

“Eu disse a uma amiga:
— A vida sempre superexigiu de mim.
Ela disse:
— Mas lembre-se de que você também superexige da vida.
- Sim.”

(Clarisse Lispector)

Essa sensação que não consigo definir está despindo meu desejo às avessas, desfazendo os entendimentos sem citar as fontes pra me desmascarar: exigente, imperdoável, implacável na arte de querer mais e melhor. Como se tivesse a pretensão de ser perfeita. Como se os vãos na alma não me fizessem chorar, como se minhas próprias máscaras não estivessem realmente gastas, como se minhas sutilezas fossem menos vis que as demais. Descubro-me num beco sem saída. Já não sei dizer se sou franca ou cruel. Não sei se minhas palavras elevam os destroem. Nem se minhas pretensões conscientes são realmente demonstradas quando a verbalização é o meio que encontro pra dizer a que vim. Aquilo que eu desejo é justamente o que se desprende de mim sempre que me abro. E não sei responder, se me perguntarem, porque a franqueza me apetece a ponto de não ter limites pra ferir. O pior é que talvez isso seja somente egoísmo. Porque afinal, não posso ferir ninguém sem me sangrar. Talvez seja isso: ou salvo você ou me perco de mim.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Ah, tá.


"Amar é como ter um pássaro pousado na mão.
Quem tem um pássaro na mão sabe que ele pode voar a qualquer momento."

Rubem Alves

Olha, eu quis te acalentar várias e várias vezes. Quis te pegar no colo como criança e descobrir teus medos e teus anseios, teus traumas, tuas reverberações. Eu quis profundamente entrar no teu mundo e sentar numa cadeira num canto lá de dentro pra te ajudar a organizar tua interminável lista de coisas a fazer com o que viveu. Tentei fervorosamente, mas o amor que não retorna seca, atrofia, morre. O meu aparentemente era utópico demais pra dar certo. Se alguém me dissesse um tempo atrás que passaria, eu diria entre lágrimas : ah, tá. Hoje sei que até o que sangra cura, até o que fere eleva, até o que frustra ensina, mesmo as dores mais agudas se vão. O que fica no lugar? Bem, isso envolve um buraco bem grande, tempo, doses de boa vontade, amizades, porres homéricos (como morfina) e um tanto de fé. Uma história pra outras estações.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Ata-me

Foto: George Portz


"Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime."

(Álvaro de Campos - Tacabaria)

Ata-me no irreproduzível espaço-tempo-história de nós dois. E não me deixes partir quando raiar o dia. Permitas que me deite sobre ti e levante os olhos aos céus numa prece incontida, requerendo continuidade de mim mesma, porque hoje vejo que sou vento leste e terminei por desabar em reticentes ais. Ata-me entre teus doces olhos, prende-me na imensidão dos teus braços, acolhe minha tentativa torta de reinventar a ilusão que havia e ressuscita a espera, os pulos do coração aflito, as lágrimas encantadas a cada partida, os ensinamentos diários de espera e encanto e não deixes que finde o tempo de te dizer do amor. Restaura-me pura e amável como fui um dia e refaze todas as minhas crenças de futuro, porque repouso sobre a medíocre verdade de que nunca soube ser depois de ti.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

A pobreza não deveria ser uma sentença de vida


O anúncio fala por si. Resolvi divulgar porque há muita coisa que ultrapassa nossos próprios umbigos acontecendo por aí, e pra mim uma das mais graves, estapafúrdias e odiosas é a segregação social: aquela que separa seres humanos iguais (vida Declaração Universal dos Direitos Humanos) tendo por base conceitos inventados. Olhe nos olhos das pessoas que passarem pelo seu caminho hoje, por mais mal vestidas, mal cheirosas ou desdentadas que sejam: elas nasceram como você, com todas as infinitas possibilidades que você nasceu! Doe um sorriso àqueles que encontrar sem discriminar a cor, a posição, a aparência! Faça algo de concreto por alguém, sem aguardar que se alardeie sua enormidade aos quatro cantos. Seja gente! Ajude a salvar a solidariedade, o amor, a igualdade.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Leva-me


Em teus sonhos, teus olhos, teus braços. Leva-me. Quando pensares, chorares, sorrires, quando te cobrires de porvires, leva-me. E traga-me contigo nos maiores encantos, reconhece minha face surpresa nas grandes descobertas, nas maiores saudades e nos cataclismas. Prende tuas heras aos meus braços quando caires e lembra-te dos beijos de olhos fechados quando a esperança se apartar de ti e não mais puderes seguir adiante. Oro para que sejas incapaz de abandonar o amor, porque o amor sentido (ainda que conjugado no pretérito perfeito) basta a si mesmo e as marcas que deixa são suficientemente poderosas para acalentar corações absortos. Eleva-te. Busca-me. Leva-me.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Pensando enquanto não escrevo nada


Estou cansado de frases feitas, e poesias de amor. Estou me redimindo dos meus atos passados, pensando no meu futuro. Agindo de forma eloqüente, a vida é só um risco, e nela só existem mudanças. Seria fácil dizer quem sou no momento, mas de que adiantaria? Amanhã já não seria mais nada. É bonito se identificar, é bonito ver o que somos, mas em um minuto deixamos de ser, e tudo se torna velho. Bom mesmo, é deixar que o silêncio responda por si só.

Hemerson F.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Pra relaxar


Do inominável naoehamor:


O amor não te dá uma vontade imensa de casar. O nome disso é noitada em Las Vegas. O amor é outra coisa.


P.S.: Vontade incrível de casar é uma coisa que só se tem uma vez. Já aproveitou a sua??? Eu estou sa-tis-fei-ta por essa encarnação e pelos séculos dos séculos, amém.

Hear me!

Descobertas




Há tanta poesia na dor que dizem por aí que ela vicia. De mãos dadas com a solidão (esse mistério personalíssimo que se encerra em algum lugar inacessível no de dentro), a dor induz à sensação inenarrável de se esvaziar para se preencher daquilo que falta. E o fenômeno há que ocorrer sem muita assistência técnica. Porque nem mesmo o amigo mais íntimo consegue trespassar seu peito aberto. E você perde muito, muito sangue mas perceberá brevemente que o coração não parou, você não morreu, apenas inaugurou mais um acesso ao salão dos seus sortidos e laboriosos limites e seus horizontes se alargam um tanto mais e você passa a se divertir com a efemeridade encoberta em cada começo. Eis que surge o mistério da fé. E da crueldade (algumas pessoas tendem a divertir-se daí em diante, subjugando incautos à mesma sensação). Autoconhecimento. Viagem lancinante.

terça-feira, 4 de maio de 2010



hoje me desfiz dos meus bens
vendi o sofá cujo tecido desenhei
e a mesa de jantar onde fizemos planos

o quadro que fica atrás do bar
rifei junto com algumas quinquilharias
da época em que nos juntamos

a tevê e o aparelho de som
foram adquiridos pela vizinha
testemunha do quanto erramos

a cama doei para um asilo
sem olhar pra trás e lembrar
do que ali inventamos

aquele cinzeiro de cobre
foi de brinde com os cristais
e as plantas que não regamos

coube tudo num caminhão de mudança
até a dor que não soubemos curar
mas que um dia vamos

Martha Medeiros - De cara lavada

Tô indo embora. Deixo aqui a quase certamente lúcida impressão de que fiz o melhor que pude com os recursos que tive. Procurei emendar meus defeitos com o último lançamento da super cola, mas há coisas irremediáveis, paciência. Tô seguindo outros rumos, arrumando outro prumo, inaugurando outro norte. Tô indo embora. Deixo as paredes vazias de mim, a cozinha das tardes de domingo sem cheiro de bolo de laranja, os dias sem as flores nos cantos da sala. Fica tudo certo: cada um com seus desejos, com seu futuro e com a própria cama pra arrumar. Estejamos certos, eu e o tempo, de que ir embora traz a doce oportunidade de reinventar.